quinta-feira, 11 de junho de 2009

A fotografia na parede

A fotografia na parede era um pretexto para falar do afeto. Um espaço, feito aquele, que ficava atrás do corpo de Cosmo, e do qual jamais conseguia ver nada. Todos temos tais espaços cegos que nos persegue, mas ele o considerava sagrado. Dizia morar ali o seu anjo da guarda. Na sala, frente às imagens do avô e da avó, era assim. Moraram, de fato, ali na casa, onde agora morava Cosmo. E os apontava aos visitantes: - Vovó era um doce. Vovô, um trator.
Ela doceira, de mão cheia, ele agricultor, que trabalhava de sol a sol. Ambos concediam, na visão de Cosmo, à definição presente de suas personalidades, o fruto de seus labores passados. A viva explicação do neto tinha algo do silencioso flutuar de uma recordação. Quando saía à lida, e lhes virava as costas, Cosmo jamais esquecia um simulado “tchau” reverencioso. Como se quisesse apenas lhes apresentar o seu anjo da guarda.


Um comentário:

  1. Maravilha,

    Quem não tem uma fotografia na parede ou na memória. Um recorte em preto e branco de algum momento do passado.

    Belíssimo, meu amigo Alaor.

    Abraços.

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