domingo, 3 de outubro de 2010

Pediu à mãe

Pediu à mãe que assinasse seu nome na lista de presença do velório do tio. Tinha compromisso naquela tarde, explicou, com iluminado ferrão do desdém. Na verdade, marcara com pastor, seu sócio nos negócios, de irem juntos à Vila das Relíquias, para realizarem o “Culto da Fartura”: evento que reuniria os miseráveis residentes do lugar em torno da água azeda de um vaso de flor, para orarem por prosperidade coletiva. Trabalho é trabalho, justificou à velha, enquanto dobrava uma fatia de pão pra dentro da boca. Sob as pálpebras abaixadas seus olhos dissimulados vislumbravam o lucro iminente, minguado, mas certo e fácil. Saiu superveniente. Só não contava com as imprudências da vida. Zezão BC, o traficante do lugar, ordenou a dois dos soldados de seu exército que “dessem um ganho” na sacolinha dos bíblias. Houve resistência, houve o fim. Mal enterrou o irmão, a pobre mãe retornaria àquele cemitério pobre: transtornada e ruim dos nervos.

3 comentários:

  1. Numa manhã nublada, com propagandas eleitorais poluindo olhos e ouvidos, nada como ler crônicas de rara competência, alívio imediado. Beijos procê, meu caro. Bom domingo.

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  2. Céus! Essa é dos infernos. Tudo tão bem dito (nesse contexto maldito) em tão poucas palavras. Bendito seja o bom autor.

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  3. Matou a pau, hem? Saludos macanudos.

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