sábado, 7 de novembro de 2009

De quatro

De quatro, com o fiofó empinado à Lua, Amélia procurava no carpete felpudo o número 69 do jogo de tômbola. Não tinha a menor vaidade. Viciara-se no bingo assim que perdeu Humberto, numa carreira. Foram menos de seis meses de convívio tumultuado. Choviam-lhe tapas por motivos fúteis, em todas as partes, caíssem onde caíssem. Olho, pescoço ou ouvidos. Nas costas, na nuca ou na boca. E conformava-se. Descansava a bochecha na mão, toda pesarosa, com a cabeça torcida alternadamente para a direita e a esquerda. Briga e descompostura o tempo todo. Casara-se já idosa, nutrindo um amor cego aos interesses escusos e etílicos do rapagão.
Foi com uma risada lateral, de boca ensangüentada, que decidiu dar um basta àquela vida submissa, depois de cuspir, naquele mesmo carpete, o pedaço gordo do pênis de Humberto. “Foi sem querer, doutor”, explicou ao delegado xereta, mostrando o galo do soco que levara na cabeça, “justamente naquela hora”.

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