domingo, 29 de novembro de 2009

Conto vagões

Conto vagões de trem desde criança. Cada comboio que passa é uma aritmética doente, feito uma felicidade com limite. Também, acho que não existe felicidade sem limite. Vou seguindo os forçosos caminhos lógicos: um, dois, três, até o último. Os trens cresceram com as cargas. De gente, eram menores. Agora, além de enormes, parecem estátuas carentes de arte, passando em série. Nenhum aceno do vagão cinco ou um gracejo do vagão vinte e dois. Só aquele brilho outonal, empoeirado pela indiferença e sem conceito sobre si mesmo. Diabo de um rio sem peixe, serpente desprovida de veneno. Mas até que não vem o fim não saio dessa cadeira. Não paro os números pela metade...
Nesse meu aniversário de oitenta anos deram-me uma locomotiva de brinquedo. Vai ver imaginam que eu goste de trem. Odeio! Conto todos porque sempre pensei em explodir um deles pela metade, mas nunca cheguei a um número absoluto que fosse a metade. Daquele, bem no meio. Eles mudam de quantidade. Deve ser para atormentar minhas contas. Safados. Na dúvida, mantenho essas dinamites no guarda-roupa há quarenta anos. Se não errei até agora, espero mais um pouco. Quem sabe padronizam, para o meu prazer.

2 comentários:

  1. Olá Alaor,

    Personagem maravilhoso, libertário. Acho que em: "também, acho que não existe felicidade sem limite", é muito mais que a expressão de uma persepção sensorial, mas uma vontade de arrebentar com os limites.
    Belíssima crônica. Muito obrigado pelo prazer da leitura.

    Abraço.

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