quinta-feira, 17 de junho de 2010

O marido era preto

O marido era preto e leve; Valéria amarela, pesada. Dois improváveis, como poucos se vêem, viram-se num parque sem tempo, hora do almoço. Raras enciclopédias ele vendeu naquele dia ambulante. Faxinas desfeitas pelos alunos do colégio ela as refez, paciente. Na pausa do meio-dia, iniciariam os meses, anos. Olhos e coração do marido se encheram de valores, valerias, Valéria. Olhos puxados, corpo estendido, alargado ao banco, queda ao flerte. No material do trabalho ele descansou a vista na letra esse, sushi, o começo com comida convidada. Decerto daria amor. Deu. Pureza tanta. Viviam porque se viam. Contou que quis ser contador. Ela, bailarina. Contabilizaram danças, goles de guaranás, até sushi com feijoada pros dois gostos comeram. Velhinhos vivem num sorriso usado. Foram três por aí, com o nipo-afro-descendentezinho à frente. Quatro, na tentativa de um casal. Cinco, quando era chega, mas chegou sem avisar. Amam-se no futuro, na cadeira do quintal, sem reclamações de esquecimentos, monotonia ou morte que os separe.

(À contista gaúcha Ana Santos, autora do (futuro) livro O que faltava ao peixe)



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