sábado, 22 de maio de 2010

Um córrego


Um córrego vertical escorria entre as pernas de Gilberto. Cerveja vista à distância, pelos fundos do efeito, sempre termina no banheiro mais próximo. Com um olho sartreanamente para o ser o outro para a nádega de Valéria, que via pela minúscula janela do banheirinho putrefato, Gilberto confundia sua atenção, sem saber direito de qual dos dois deveria cuidar primeiro. Outro efeito do álcool, que o levava a desenhar um ponto de exclamação com a boca, outro, de interrogação, com as pernas, e a configurar um tortuoso caminho de dúvida: a quem acudir?
Certo é que já saiu errado do banheiro. Com as calças mijadas abordou Valéria, soberano como todo bêbado. “Há mais coisas entre o céu e a terra do que as que o seu pedantismo conhece”, retrucou a infante, cabreira. Num viés pra fazer graça, Gilberto desconversou: É o que o réu disse quando lhe puseram uma corda no pescoço? É uma lição que nunca esquecerei.

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