quinta-feira, 27 de maio de 2010

Lancinante lhe seria


Lancinante lhe seria leve. A dor de cabeça de Miranda era aflitiva. Como se o cérebro em revolta de repente cismasse em não caber mais na caixa craniana, e optasse por saltar pelas têmporas. Miranda implorava um par de óculos escuros, capaz de lhe devolver às cegas o sentido da existência. Cambaleava no ponto de ônibus, quando encontrou Laina Kariny, a porreta nordestina loura, esticada numa calça colant e esvoaçada em sua blusa de seda policromada. Contou-lhe o drama sem conhecê-la, e ouviu atônito: “chifre!”. A princípio não queria acreditar no que ouvira. Entre uma dolorosa fisgada e uma pulsação sofrida, que lhe palpitavam desde o crânio, ainda conseguiu argumentar: “eu nem casado sou, nem tenho mulher ou namorada”. E Laina Kariny não recuou: “de outra encarnação!”. Num misto de exorcismo, descarrego ou inconseqüência pura, deu-lhe um tapão seco, no pé do ouvido esquerdo. Miranda desequilibrou-se e caiu perplexo, enfurecido. Laina Kariny, provocadora, sorriu pra ele, e tirou da bolsa um analgésico comprimido: “nesse caso, isso aqui pode curá-lo!”.

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