quarta-feira, 5 de maio de 2010

De cortesia

De cortesia ganhou apenas a bucha já seca. Nada de água. Nem cheiro de sabonete. Pedira um banho mas, naquele fim de mundo, pedir não era o bastante, seria necessário comprá-lo. Perguntou o preço ressabiado. Também não tinha muito a oferecer por um balde com água. Não tinha, na verdade, quase nada, que dirá a oferecer. Mas escutou a resposta: recebida como uma ducha de água fria. Não tinha meios para custear o esmero, o valor do asseio. Afinal de contas, somado o desejo à situação, melhor seria subtrair vontades frívolas. Sim, inúteis, naquele canto remoto onde nem havia decoro nas vidas, que dirá bom-tom! Decidiu seguir para mais adiante. Ir à luta para vencer, porque voltar seria uma derrota. Então chegou onde não devia. Já não havia chances de sobreviver sem o amor de Amélia. Nem havia bucha, seca que fosse, para um gesto de cortesia naquele lugar solitário.

(Ilustração: “Solitário”, 1925, de Oswaldo Goeldi)

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