domingo, 28 de fevereiro de 2010

Sobre o silêncio

Sobre o silêncio Sandoval sabia bem. Filho de mãe muda, nunca ouvira bilús-tetéias ou “de quem é o bebê da mamãe?”. Aprendeu o apreciar maternal. Os gestos de algodão e os olhares de fogo. Os sutis mimos da expressividade.
Contrariando as teorias freudianas, casou-se com Maria Sílvia, de loquacidade à beira da matraca. Tagarela crônica. Mulher de tantas contrações e trejeitos faciais, que tornava impossível ao silente Sandoval avaliar-lhe as elucubrações.
No começo houve um engodo manso. Maria Sílvia era do tipo “me chupa”, que se apresentava lenta, com o cacarejo suave das galinhas adormecidas. Quando se deu conta, Sandoval já havia marcado o casamento e convidado a família. E os cocoricós tornaram-se mais efusivos. O mal de Sandoval foi deixar-se levar pelo atordoamento daquela explosão de falas. Nem reparou que a mãe, quieta em seu canto, apenas balançou a cabeça de um lado para o outro, com uma negatividade mínima.

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