sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Do tipo bajulador

Do tipo bajulador, conhecia todos os ódios do patrão: os coloridos, expressos por um racismo doentio; e, os sólidos, marcados pela vontade de esmurrar os inimigos. E lá se punha ele, o Heitor, a odiar simultaneamente negros, asiáticos, mulatos e índios. Até o trato intestinal de seu patrão Heitor sabia, de ponta a ponta, da boca ao ânus.
Entrava em trechos de conversas do chefe, sempre com um estimulante “é isso mesmo”, “como eu digo sempre”, “isso, sim, é que é”. Fragmentos, olhadelas, percentuais ínfimos de agrados do seu senhor lhe bastavam, para chegar a um deleitoso estado de dever cumprido. Entendia que o problema das pessoas livres era justamente o fato de não terem noção do valor da liberdade. Submissos não precisavam enfrentar tal problema.
Naquela manhã a fachada da empresa estava coberta por uma neblina densa. Pareceu-lhe até que não havia chefe. Tentou olhar por um vão da vã janela esfumaçada, e nada. Tateou o trinco, e a porta se abriu. Jazia o chefe coberto de sangue, no tapete aspirado na véspera. Heitor soltou um “ó” horrorizado. Chegou bem perto e chutou sem piedade a cabeça do corpo. “Traidor”, balbuciou sem profundeza. Limpou o sapato, e partiu em busca de um novo emprego.

Nenhum comentário:

Postar um comentário