quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Os buracos executados

Os buracos executados pelas brocas da furadeira não se conciliam com seus futuros parceiros, existentes no suporte de ferro do relógio suspenso. O tempo nunca foi sólido mesmo, mas os bufos de raiva, sim, são gasosos e, o suor, definitivamente, líquido. Desde que me meti a instalar esse objeto na parede vislumbrei, orgulhoso, o resultado final de uma decoração utilitária. O projeto previa a visão de horas alegres, sem nenhum segundo de ajustes ou infindáveis minutos de tédio.
Com o passar do tempo, verifiquei um aumento expressivo da taxa de ira. Chaves já causavam fendas na razão. Parafusos rosqueavam ódios submersos no reboco frouxo da prudência. Comecei a invejar a competência profissional dos fanáticos que crucificaram Cristo, prego a prego, e fizeram com que Ele não caísse da cruz. O diabo era que a minha incompetência se avolumava, e o relógio continuava a rodar seu ponteiro de segundos, como se risse em círculos de minha inabilidade. Parei às oito para as dez. Oito valas no reboque para as dez tentativas insanas de afixar aquele relógio na parede. No dia seguinte contratei um pedreiro para cobrir os estragos. Ele, espontaneamente, instalou o relógio, num minutinho.

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