quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Fala aos arrancos

Fala aos arrancos, bebe aos trancos e depois dorme, para acordar doloridamente lúcido e perplexo. Foi num desses momentos de inteligente condescendência e severa brandura que Olegário pensou em se auto-proibir do uso do álcool. Procurou a psicóloga, a assistente social e dona Diva, a mãe de santo, mas sempre havia uma esquina pelo caminho e, nela, um bar.
Em estado de semi-sono, quando as fantasias da alma começam a perseguir umas às outras, pensou em castigar-se de maneira oposta à do seu pecado. Decidiu beber a fonte, que decorava a praça central do pequeno vilarejo onde morava. Deitou-se de bruços e, com as mãos em concha, virou uma talagada daquela água de potabilidade suspeita. E outra, e muitas. Mas o frenesi compulsivo fazia com que não parasse, como se fosse possível engolir um mar. Os que viam formavam roda, afogavam risos e comentavam alto, até a chegada de Mariano, o policial, que decidiu eximir Olegário do ridículo. Fez respiração boca a boca, compressão cardíaca, abriu espaço à ventilação. Olegário logo retornou à realidade. E a realidade exigia um bar.

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