terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Naquela manhã

Naquela manhã, Amanda pediu às crianças que recortassem somente o papel marchê vermelho. Com rigor atento, estipulou obstinações para os encaixes, recortes a recortes, medidos à agudeza dos milímetros. Flores seriam feitas.
Naquela madrugada antecedente, Odilon chegara outra vez cheirando a álcool. Heróico cantor de seus próprios feitos. E havia marcas de batom e sexo, e bradava insidiosos palavrões desconexos, e bateu com força na alma de Amanda que, com destreza artesã, deu-lhe um basta com a tesoura no pescoço. Sangue e silêncio.
Naquele final de manhã, a pequena sala de aula transformara-se num imenso jardim de gardênias vermelhas. Cada criança, orgulhosa, mostrava sua criação ingênua e viva. Dona Adelaide, a diretora, estranhou um pouco aquela primavera rubra, mas achou tudo muito lindo, e cumprimentou Amanda, a dedicada professora de artes.

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