Predisposição ao bem não me falta, o mau é que eu não consigo me livrar do mal. Ainda ontem, por exemplo, enquanto lia uma daquelas frases de Proust, que dá pra gente desligar o abajur, ir à cozinha esquentar um arroz, comer, ir ao banheiro, brigar com o cachorro, atormentar a mulher, por a filha de castigo, assistir às chamadas do jornal na televisão, requentar o café no microondas, queimar a boca, xingar a louça, encontrar a guia de imposto perdida, maldizer o governo, tropeçar nas tiras do chinelo, passar gelol no dedão e frase não acabou, pensei, cá comigo: tô surtado!
Deixei que o senhor Swann seguisse lá o seu caminho, e abri o alcorão, pra ver se a coisa do alto ajuda. Procurei nele os desfechos malignos, que pudessem justificar tantas derivações islâmicas de meu humor ibérico, em carcaça brasileira. Mas só havia o bem universal. Demasiadamente humano para os meus atos. Senti-me um fedelho, incapaz de achar o tempo perdido.
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