sábado, 12 de setembro de 2009

O velho hoje

O velho hoje não termina. Minutos e intervalos somados mal dão conta da minha adoração pela dança. O vasto passado próximo vem com a noitinha. No clube, me afundo na tentação. Afundar na tentação é o máximo. São velhos os parceiros, mas sou assim. Meu marido pensa que pode morrer um dia, bobo. Tem baile. Tem também os netos zombeteiros: “já vai pra dança das velhinhas, vovó?”. Murmuram, brotos verdes.
Há magia nos breves movimentos. Extremamente pouco, minusculamente gigantesco, é o meu sonho bailarino. Levo-o com graça, no vai da valsa. São gozos minimalistas. Dois pra lá, dois pra cá. Acasalamentos sugeridos, flertes no compasso, ritmos de passagem. Cenas rastejantes sobre flocos de nuvens. Primordiais últimos artifícios. Não me entrego à pose de defunta, horrenda entre flores e felpas. E, ave! Marias rezando à minha volta. Não se morre aqui. Se cadáver, sou insuplicável. Quando o dia for noite, dançarei alegre. Meu velho marido ajeita a gravada, arde o rostinho em rugas, com a loção pós-barba escanhoada. Estamos quase prontos, mas faltam umas horinhas para o baile começar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário