quarta-feira, 13 de abril de 2011

Cada madeixa

Cada madeixa eternizava um amor. Lola jurava que só tivera dois, para a sorte do seu equilíbrio estético facial. Um amor pode permanecer secreto numa madeixa. Uma madeixa oculta entre os cabelos, numa cabeça. Uma cabeça consegue se dispersar na multidão de uma cidade. Uma cidade é um conjunto mais complexo, mas ainda assim mantém-se quase invisível no planeta. O universo das madeixas de Lola enodoava a complexidade recôndita. Todas ali, às vezes omissas nas pontas, outras enormes, quase até os pés. Era inconcebível reconstituir as volúpias, paixões ou sentimentos profundos da Lola apenas por aqueles fios, mesmo às duas meadas. Cansado do mistério, Antoninho dirigiu-lhe a mais definitiva das propostas possíveis: “corte-as, ou jamais serei eternamente seu”. Lola sorriu entristecida, fez de conta que sim, negaceou um não, seguiu para a cozinha e logo voltou com uma dúbia tesoura nas mãos. Antoninho não entendeu bem aquele “deixarei crescer a sua”.

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