Todos disfarçavam a evidência que Murilo morreria a qualquer momento. Ali, ao lado do cara, bocas sorridentes falavam da chuva que não vinha há tempo ou do fulano que sarou daquilo, em estado idêntico ao do Murilo. Velas repousavam ocultas na gaveta do criado mudo, a empregada falante foi impedida de entrar no quarto e o papelzinho azul, preso ao imã da geladeira, dava na cara: entregam-se coroas fúnebres em uma hora. Murilo, lá, lidava com aquilo feito uma múmia egípcia – no cheiro, inclusive. Parecia querer dizer “faça-se luz” às eternas trevas. No devir do segundo mês, Inês, a irmã, percorreu uma linha progressiva de sensibilizada (cansada, prostrada) a encolerizada, e berrou aos presentes: “vão embora, gente, quando acontecer, eu ligo”. Embora mudo há meses, Murilo então sussurrou: “não se esqueça de mim, mana!”.
sexta-feira, 21 de outubro de 2011
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